Revolucionárias | Ana Júlia Ribeiro, a estudante

Símbolo da resistência, a jovem se transformou em ícone da recente retomada do movimento estudantil no país

30.10.2017  |  Por: Karla Monteiro

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Revolucionárias | Ana Júlia Ribeiro, a estudante

“Não sei como cheguei até lá, minhas pernas tremiam muito. Mas era preciso. Na hora a gente só tinha isso: a fala de defesa do nosso movimento na Alep. O que me fez fazer aquilo? Eu estava revoltada. Faz um ano das ‘ocupa’ e eu faria tudo de novo”

Ana Júlia Ribeiro tornou-se o rosto da retomada do movimento estudantil no Brasil. Corria o tumultuado ano de 2016. Ao assumir o governo, Michel Temer lançara a PEC 241, uma proposta afofada para a reforma do Ensino Médio. Em resposta, mais de mil escolas do país foram ocupadas. Em meio ao confronto, a estudante de Curitiba, então com 16 anos, subiu ao púlpito da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) e, diante de uma plateia de deputados, a maioria de partidos conservadores, defendeu a causa. A fala carregada de emoção, verdade e espírito de luta se alastrou como pólvora nas redes sociais.

O movimento estudantil começara a renascer um ano antes, em São Paulo, quando os secundaristas, inspirados na Rebelião dos Pinguins, a maior revolta estudantil da história do Chile, ocorrida em 2006, conseguiram derrubar a proposta do governador Geraldo Alckmin de reorganizar as escolas do estado, que envolvia cortes de unidades. Após o impeachment da presidente Dilma Rousseff, com a proposta do novo governo de mexer na grade curricular, o levante ganhou força nacional.

Filha de uma professora e de um advogado, Ana Júlia estudava no Colégio Estadual Senador Manuel Alencar Guimarães, no bairro Mercês, um dos mais tradicionais de Curitiba. Os paranaenses estavam liderando o movimento contra a chamada PEC das Reformas. No Estado, 800 unidades encontravam-se fechadas. Sem qualquer experiência de militância, ela se viu no centro de uma revolta nacional. Até então, sua única preocupação era se preparar para o Enem e cursar Direito, vislumbrando uma carreira na área de defesa dos Direitos Humanos.

Ao ser convidada para falar em nome dos estudantes na Alep, Ana Júlia tornou-se símbolo de resistência, chegando a ser comparada pela imprensa internacional a Malala Yousafzai, a ativista paquistanesa ganhadora do Nobel da Paz. A revista Forbes chamou-a de “futuro da juventude”.


Ela por ela

“Não quero que digam que sou liderança. No movimento, não usamos essa palavra. Não acreditamos em lideranças. Até o início das ocupações contra a PEC 241, em 2016, meu envolvimento com o movimento estudantil era zero. Aliás, não havia movimento estudantil.

Nosso movimento começou com duas pautas muito fortes e muito bem definidas: a reforma do Ensino Médio e o corte de investimentos. E havia a conjuntura do momento. A galera estava perdida com o que tinha acontecido. De repente, tínhamos um presidente em quem ninguém votou. Apesar de a gente só ter 15, 16, 17 anos na época, estávamos acompanhando as coisas e confusos com a situação do país.

Embora pareça que não, o impeachment tem tudo a ver com o renascimento do movimento estudantil. Na semana em que fiz o discurso na Alep, havia saído a reintegração de posse de várias escolas. E um colega nosso, o Lucas Eduardo Araújo Mota, que estudava numa escola próxima à minha, tinha acabado de morrer. Ele foi morto por outro colega, após um desentendimento, e o governo estava usando isto para acabar com o nosso movimento.

Daí me convidam para falar em defesa das ocupações na Alep. Não sei como cheguei até lá, minhas pernas tremiam muito. Mas era preciso. Na hora a gente só tinha isso. No mesmo momento, estava rolando uma assembleia de estudantes, para apresentar o nosso posicionamento. E a fala de defesa nos foi dada pelos deputados. O que me fez fazer aquilo? Acho que eu estava revoltada. Estavam usando o Lucas daquela forma, falavam da gente como se não tivéssemos senso crítico, como se fôssemos objetos manipulados. O momento foi muito difícil. Nas redes sociais fui atacada, mas o carinho foi maior.

Faz um ano das ‘ocupa’ e eu faria tudo de novo. Hoje eu viajo o Brasil inteiro fazendo conversas com estudantes, organizando o movimento, dialogando com estudantes de outros países. Cheguei esta semana da Costa Rica. Já estive na Índia. Posso dizer que me tornei uma ativista.”

 

– Veja a lista com todas as revolucionárias –

 

 

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