5 livros eróticos

Por que se deitar com D.H. Lawrence, Hilda Hilst, Georges Bataille, Anais Nin, Guillaume Apollinaire e (na categoria 'hors-concours') Raduan Nassar

25.03.2020  |  Por: Maria Clara Drummond

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5 livros eróticos

No início do mês, o Pornhub liberou todo o seu conteúdo premium de graça para os italianos presos na quarentena imposta pela pandemia do coronavírus. Afinal, se está proibida a troca de fluidos, é bom ter muitas opções para resolver esse assunto sozinho. Pensando nisso, selecionamos cinco obras de literatura que têm o erotismo como tema. Escritores são pessoas meio esquisitas que exploram os cantos mais escuros da alma. O inconsciente humano é cheio de desejos proibidos que nós mesmos negamos que existam. As cenas sexuais contidas nesses livros ora excitam, ora causam imensa repulsa, ora fazem rir. Portanto, não esperem um papai-e-mamãe literário, tampouco um melodrama toscamente escrito à la 50 Tons de Cinza, e sim descrições mais sombrias, que deveriam vir com o aviso: não tente fazer isso em casa.

1. O Amante de Lady Chatterley, D.H. Lawrence (1928)

Eu poderia descrever esse livro com aquela famosa expressão: amor de pica é o que fica. É o único desta lista que pode ser considerado de fato uma história romântica. Trata-se de um clássico caso de amor proibido, a mulher de classe alta apaixonada pelo operário, mas visto pelas lentes do sexo, o que fez com que o livro fosse censurado, e só publicado em 1960. Constance Chartterley é uma jovem moderna para a sua época – por exemplo, não casou virgem. No entanto, seu marido aristocrata fica paraplégico depois de lutar na Primeira Guerra Mundial (isso fez com que o livro também fosse considerado um libelo anti-guerra). Constance sente-se incompleta com a distância física e emocional do marido, e encontra conforto nos braços do caseiro, Oliver Mellors (foi a partir desse livro que o jardineiro sexy tornou-se um senso comum do erotismo – Charlotte York de Sex and the City que o diga!). Um detalhe triste e trágico de sua biografia: D.H Lawrence sofria de tuberculose, doença que, simultaneamente, atiçava a sexualidade e causava impotência. Que fiquemos então com suas palavras eternas sobre o tema: “What we need is tenderness towards the body, towards sex, we need tender-hearted fucking” (O que precisamos é de ternura em relação ao corpo, em relação ao sexo, precisamos de trepadas de coração terno, em tradução literal).

2. Pornô Chic, Hilda Hilst (2018)

Esta coletânea, renomeada de forma um tanto mercadológica, reúne a trilogia obscena escrita no início dos anos 90 (O Caderno Rosa de Lori Lamby, Contos d’Escárnio – Textos Grotescos, Cartas de um Sedutor), além dos poemas Bufólicas. Hilda Hilst escreveu essa série para justamente para chamar a atenção do grande público. O resultado acabou desagradando os críticos da época. Hoje, são clássicos que ficam par a par com sua obra mais erudita – Hilda Hilst, famosa por sua sofisticação intelectual, não resiste em deixar um leve toque de Heidegger. A novela mais famosa do combo é Lori Lamby, um relato escandaloso feito pela personagem de apenas 8 anos de idade, que na verdade é uma crítica ao mercado editorial da época.

3. História do Olho, Georges Bataille (1928)

O escritor francês bebe diretamente de seu conterrâneo Marquês de Sade – referência até hoje no que concerne putaria literária. O livro tem tantos traços autobiográficos que foi publicado originalmente sob o pseudônimo de Lord Auch. No entanto, mais do que ações factuais que possam ter acontecido, trata-se de um mergulho num inconsciente atormentado, ilustrado através do amor juvenil de três adolescentes experimentando a sexualidade. É violento, é mórbido, é perturbador. Eu me lembro até hoje da minha primeira leitura, nove anos atrás. A culpa por ter gostando tanto do livro acompanhou por muito tempo minha subjetividade formada pelo catolicismo fervoroso. O romance é um marco que influencia artistas de diferentes mídias até hoje – os cinéfilos vão reconhecer uma das cenas mais emblemáticas no monólogo da orgia dito por Corinne em The Weekend, do Godard. Você nunca mais vai conseguir olhar para um pires de leite da mesma forma.

4. Delta de Vênus (1977) e Henry & June (1990), Anais Nin

É difícil escolher apenas uma obra dado que são propostas tão diferentes. O primeiro é uma coletânea de contos eróticos encomendados por um colecionador de livros a Henry Miller e Anais Nin. São livros feitos com objetivo unicamente financeiros, um dólar por página. O cliente estipulou de forma explícita que “deixassem a poesia de fora”. Anais Nin, no entanto, aproveitou a oportunidade para elaborar a experiência sexual a partir do olhar feminino. “Durante séculos tivéramos somente um modelo para esse gênero literário – a escrita dos homens”, diz ela no prefácio. No entanto, ela mesmo admite que é nos diários que esse ponto de vista é demonstrado mais claramente. É aí que entra Henry & June, que reúne as entradas do diário que correspondem à relação da escritora com sua grande influência literária e sexual, Henry Miller (e sua belíssima mulher, June). Coincidência: Quando os dois se conheceram, Anais Nin estava justamente trabalhando em um livro sobre D.H. Lawrence.

5. As Onze Mil Varas, Guillaume Apollinaire (1907)

Eis um título sugestivo. O escritor e crítico de arte é mais conhecido pelo seu papel na vanguarda francesa do início do século e por ter cunhado o termo “surrealismo”. Na sua incursão pela literatura erótica, vemos mais uma vez que o gênero não escapa da inevitável influência de Marquês de Sade. A trama é a seguinte: um príncipe romeno passeia pelas ruas parisienses transando com todo mundo – tout court. Confesso a leitura me provocou mais gargalhadas do que qualquer indício de excitação sexual – o humor do livro é proposital. Infelizmente, temos um fato biográfico bad vibes para tempos de pandemia: Apollinaire morreu jovem adoecido pela gripe espanhola, em 1918.

Extra|Hors-concoursUm Copo de Cólera, Raduan Nassar (1978)

Esquece toda esta lista. O livro mais sexy já escrito em toda a história da literatura mundial é este. No cinema, há a infame lista de piores cenas de sexo do cinema. Na literatura isso sequer existe, uma vez que é de conhecimento unânime que não há nada mais difícil que escrever uma boa cena de sexo. Por isso mesmo este livro merece ser tão louvado. É sutil, é sensual, é misterioso, é poético. Eu poderia desenvolver inúmeros elogios que se desenrolam por longos parágrafos mas sinceramente me faltam palavras. Não consigo pensar em nada mais sublime do que esta pequena novela.

 

Maria Clara Drummond é jornalista e escritora, autora dos romances A Realidade Devia Ser Proibida (editora Companhia das Letas, 2016) e A Festa É Minha e Eu Choro Se Eu Quiser (editora Guarda Chuva, 2013)

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