Cuide da sua atenção
De todas as atitudes importantes para mantermos a nossa saúde mental em 2019, talvez a mais urgente seja aprender a filtrar o excesso de informação
09.01.2019 | Por: Gaia Passarelli
Use menos o celular. Leia livros. Faça caminhadas. Tente uma dieta vegana. Pratique ioga, pilates, Rolfing, meditação. Encomende leitura de mapa astral perto do seu aniversário, agende uma tirada de tarô, transe cromoterapia. Escreva sem distração por pelo menos dez minutos todos os dias. Lembre aniversários dos amigos, faça as pazes com parentes. Beba menos. Pise na terra, adote um bichinho, aprenda a cuidar de plantas.
Eu poderia escrever uma lista como essa por horas a fio e depois fazer updates semanais com tudo o que você precisa fazer, saber e ter para levar uma vida mais saudável, mais humana e menos dependente do digital. Daí depois eu iria postar uma foto linda e sorridente no Instagram com uma hashtag tipo #FelizNoSimples. Funcionou? Não.
Porque é muita coisa.
De todas as atitudes importantes para mantermos a nossa saúde mental em 2019, talvez a mais urgente seja aprender a filtrar o excesso de informação.
Um estudo conjunto da Universidade do Sul da Califórnia e da Universidade Aberta da Catalunha, chamado “A capacidade tecnológica do mundo de armazenar, comunicar e computar informações”, publicado pela revista Science em 2011 e citado em reportagem no Nexo, no final de 2018, fala sobre a gangorra que vivemos hoje. A análise indica que vivemos entre dois estados de atenção, as chamadas redes de tarefa positiva (quando focamos numa tarefa específica) e negativa (quando descansamos o cérebro). Segundo os pesquisadores, quando passamos constantemente dos estados de atenção para distração e vice-versa, o resultado é cansaço e confusão mental.
Parece familiar porque é mesmo.
Sinais visuais, sonoros e sensoriais, redes sociais que apitam, notícias compartilhadas, muitas vezes inverídicas, querendo sua atenção por uma fração de segundo. Essa competição cruel de alertas não dá descanso nem quando dormimos — quem nunca levantou para beber água ou fazer xixi e acabou com uma luz azul na cara?
Acontece que é justamente nos estados em que o cérebro está em descanso que nossos estalos de criatividade, talvez a mais humana de todas as qualidades, podem acontecer. Sabe quando você está tomando banho e tem uma ideia para um problema que anda te atormentando? Ou quando vai dormir e aquele e-mail que deveria escrever de repente toma forma na sua cabeça? Quando caminha e se lembra de algo que se prometeu fazer mas tinha esquecido? Isso é sintoma de uma mente em momento saudável. Se esses momentos são cada vez mais raros, se a solução de problemas, inclusive os mais banais, parece impossível, se um novo alerta de WhatsApp faz você se sentir ansiosa várias vezes por dia, se essas sensações parecem inseparáveis da sua vida agora, então preste atenção: você precisa parar.
Mas o que gente pode fazer para viver sem pirar? Muitas coisas. De acordo com outro estudo, o Relatório de Tendências da Ford para 2019, mais e mais pessoas entendem a necessidade de equilíbrio entre a vida conectada e experiência “in real life”. Controlar o tempo de uso de tela será habilidade essencial neste momento de distopia da informação, e isso passa por aprender a domar o déficit de atenção, diminuindo o consumo dos estímulos que nos são oferecidos.Por isso, retomo a lista do começo deste texto.
Desligue notificações. Saia de grupos de WhatsApp. Desinstale todo aplicativo não essencial. Instale aplicativos de contagem de tempo e aprenda a monitorar o quanto você passa vendo a tela do celular. Deixe o celular e/ou o computador fora do quarto quando for dormir. Passe a enxergar o tempo offline como tempo ganho. Reaprenda a sair de casa sem levar o aparelho, estabeleça limites de uso nos fins de semana.
Via de regra: em 2019 aprenda a consumir menos e melhor, inclusive a informação.
Gaía Passarelli é jornalista e escritora, autora de Mas Você Vai Sozinha? (Globo Livros, 2016). Nascida e criada em São Paulo, mora num prédio velho da Bela Vista com o filho, três gatos e uma crescente coleção de guias de viagem. Você a encontra no twitter @gaiapassarelli e no site gaiapassarelli.com
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