Eu nunca quis ser mãe, mas quero ter um filho

A mulher racional que habita em mim está em conflito com a que quer parir. E, para minha surpresa, a segunda está ganhando

11.01.2022  |  Por: Mariana Neves

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Eu nunca quis ser mãe, mas quero ter um filho

A maternidade nunca esteve em foco na minha vida. Ao longo dos anos fui absorvendo inconscientemente a ideia de que ser mãe é cuidar dos outros e esquecer de si – e eu não gostei nada disso. Parecia que, se eu gerasse outra vida, a minha perderia a importância quase imediatamente, que eu deixaria de ser eu e viraria uma mãe, como todas as outras, afinal, mãe é tudo igual, né? (Quem nunca ouviu/disse essa, que atire a primeira pedra.)

Mas a vida acontece e quase nunca é como a gente imaginou que seria. Hoje, para o choque da Mariana de 20 anos de idade, passar por crianças fofas na rua me arranca um sorriso automaticamente, e a ideia de ser corresponsável por uma nova vida já não me parece nem um pouco absurda.

Em algum momento, nos últimos 10 anos, alguma coisa mudou dentro de mim. Mas, ao mesmo tempo, no lado de fora, a bomba da maternidade real explodiu. Entre pais, tias e perfeitos desconhecidos que descobriram que eu era casada me perguntando quando eu teria filhos, surgiram os textos sobre como ser mãe é treta. E dentro da minha bolha feminista, só se fala disso. E a sensação é de que tudo o que me afastou da maternidade foi confirmado, então por que a recente vontade de ser mãe não vai embora?

Outro dia minha prima me disse “eu consigo enumerar vários motivos para não ser mãe, mas mesmo assim, eu quero”. Essa frase traduziu bem o que eu vinha sentindo e me fez refletir.

Fui percebendo que, ultimamente, quase toda informação que chega até mim sobre maternidade é negativa: violência obstétrica, altos índices de cesárea, pais que desaparecem, mulheres que são forçadas a sair do mercado de trabalho… a lista não acaba. Sem falar no filme A Filha Perdida, dirigido por Maggie Gyllenhaal e baseado no livro homônimo de Elena Ferrante, que vem incendiando as discussões sobre as profundezas da maternidade nas redes.

Além de todos os dados e estatísticas assustadores, as informações sobre o jeito “certo” de cuidar de um bebê me preocupam. Parece que todas as ferramentas que nossas mães batalharam para conseguir um pouco mais de facilidade nessa jornada tão difícil estão sendo refutadas. Fraldas descartáveis são muito poluentes, leite em pó não é nada nutritivo comparado com o materno, papinha industrializada de jeito nenhum, tem que preparar em casa com ingredientes orgânicos. Tá muito ocupada e precisa se concentrar? Nada de deixar o bebê no cercadinho, ele tem que ter incentivos constantes, você tem que deixar ele livre, solto e ficar em vigilância para ele não se machucar.

Apesar de ser indiscutível que todos estes assuntos devem ser abordados para que haja alguma mudança, eu sinto falta de escutar, da boca das mulheres que eu sei que mandam a real sobre a maternidade, o lado bom, que vai dar tudo certo, que eu consigo, que vai valer a pena e que eu ainda vou ter minha própria identidade, ainda que em uma nova versão. Porque, nos textos que super romantizam a maternidade, eu nunca acreditei.

Tá, eu entendi que é difícil e cansativo. Mas e o que é bom, é suficiente? É por isso que a gente continua massivamente tendo filhos? (hello, 9 bilhões de pessoas no mundo). 

Eu assisti passivamente à maternidade sair de um lugar irresponsavelmente idealizado para se transformar em um grande aviso de perigo, e agora a mulher racional que habita em mim está em conflito com a que quer ser mãe. E, para minha surpresa, a segunda está ganhando. Alguém me explica por quê?

Mariana Neves é designer, artista visual e empreendedora. Colaborou com diversas agências e editoras, como Abril, Trip e Todavia, e hoje comanda a GC36, galeria de arte colaborativa em São Paulo

25 Comentários

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25 respostas para “Eu nunca quis ser mãe, mas quero ter um filho”

  1. Ive Teles disse:

    Puxa, Mariana. Vc leu minha vida aí. Quando vc descobrir a resposta volte aqui. Beijos

  2. Natália Junqueira Trarbach disse:

    Também sou designer e sou mãe de dois. Diferente de você eu sempre tive o idea de ser mãe… mas não naquela hora, não naquela fase, haviam tantas metas a serem alcançadas ainda e na minha percepção, se fosse p ser mãe, queria ser do time das boas. Pois bem, minhas duas gestações me assustaram, a primeira pq não foi planejada (tinha 27) e a segunda pq meu filho tem síndrome de down e alguns problemas de saúde (tinha 32). Nas duas vezes larguei meu emprego, pq fui mãe do time das boas. Não que quem não largue não seja, não é isso, mas eu sabia que do jeito que eu sou com o trabalho… só funcionária assim. E me doeu largar minha carreira, mas eu arrisquei e me dediquei os 2 primeiros anos a cuidar deles da melhor forma possível. Fiz meus bicos, mas pensei “pronto, nunca mais volto, não vou conseguir”. Das duas vezes eu voltei, e cada vez voltei melhor, na minha área, em lugares bacanas. Não me arrependo e sabe porquê? Porque fiz o que meu coração mandava. Dói, mas a única dor é a do medo de mudança…o resto, minha amiga, fichinha! O cansaço se cura com amor! Ah, e eu usei fralda descartável, mas faço suco natural; preparei todas as papinhas, mas minha filha mais velha chupou bico; não usei chiqueirinho, mas usei jumper…pq se ouvir tudo que dizem… Você enlouquece! Boa sorte!

  3. Érika Gardés disse:

    Que texto maravilhoso!
    Me sinto exatamente assim!Acho que não quero passar pela vida sem saber o que é esse amor.
    Gratidão.

  4. Évane disse:

    Se a vontade veio, tenha filhos. Hoje em dia como voce mesma disse se destaca imensamente o lado ruim de ser mae, e estao esquecendo de contar as coisas boas tambem. E dependendo de com quem você vá ter filho, e de como encare a jornada, o lado ruim talvez nem aconteça nessa intensidade que estao deflagrando por aí. Cada experiencia é unica, eu vejo que meu maternar nao tem nada a ver com o nivel de stress do maternar de outras amigas. Eu as vezes queria escrever sobre como tem sido boa a jornada de ser mae, de ver meu filho crescendo, desenvolvendo, se tornando um menino amororo e engraçado, como ainda consigo arranjar tempo com meu marido para sermos casal tambem e amigos, fazermos nossas coisas de familia, coisas de casal e coisas nossas individuais, mas tenho vergonha de ser acusada de ser uma “Alice no país das maravilhas” ou de estar romantizando a maternidade. Meu filho tem 4 anos e nesse meio tempo alem de ser mae, trabalhei, estudei pra concursos, saí com amigas, saí com meu marido. O diferencial pra mim foi a rede de apoio, isso torna o maternar mais leve e aí a minha maternidade é romantica mesmo kkkkkkk e tambem o fato de eu ser uma “péssima” dona de casa, que nao faxino todo dia, nao deixo o chao obsessivamente limpo. Aqui em casa cada um vai fazendo o que dá, como dá, a unica prioridade inegociavel é a alimentaçao do nosso filho e mante-lo limpo e feliz. E eu nao me arrependo em nada de ter tido meu filhote, e para quem quer sempre digo: recomendo rs um beijo, boa jornada!

  5. rosimery saulo disse:

    Genteeeeeem!essa sou eu, me indentifiquei com o texto dela. Eu nunca quis ter filhos, nunca foi meu sonho, mas sempre idealizei ao ver um parquinho com crianças brincando, ao ver coisas de super heróis, etc e imaginava, o dia que eu tiver um filho, e se eu tiver né? Pensava assim. Vinha na cabeça a educação que tive da minha vó, e como ela marcou minha infância, e da importância que tudo tem para uma criança crescer feliz. E qnd eu fazia esportes, pensava se eu tiver um filho, gostaria de poder viver isso com ele. E hoje eu tenho 😍, meu filho fez um aninho, e hj estou muito feliz pois vou poder viver tudo isso com ele. Um conselho que eu dou, é… Tenha um filho sim, com ele você vai viver seus melhores sonhos. E não se arrependerá nenhum dia de ter esse amor.

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