Fashionista sustentável

Com dicas de styling inusitadas, uma história de consumismo pra contar e vontade de mudar o mundo, Giovanna Nader é a consultora de moda dos novos tempos

18.04.2019  |  Por: Isabel de Barros

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Fashionista sustentável

Giovanna Nader, 33 anos, a consultora de moda dos novos tempos. Pensa em estilo sem perder o foco na sustentabilidade. Mas nem sempre foi assim: a mineira de Araguiari, que morou em São Paulo e está há três anos no Rio de Janeiro, tem um passado de consumista hardcore de fast fashion. “Nunca fui de marca, até porque não tinha grana pra isso. Mas era a louca da moda fast”, diz ela, que hoje conta com um único jeans no armário.  Giovanna conhece bem o ciclo do consumismo. “A sensação de ansiedade, a compra, o prazer efêmero e depois o vazio para começar tudo de novo”, como descreve, já fez parte de sua vida. E até por isso há sinceridade no que ela fala.

As mudanças começaram a acontecer em 2015, quando criou o Projeto Gaveta, de troca de roupas, e passou a ver a produção fashion com outros olhos. Os tecidos e o descarte da indústria entraram na pauta e, assim, o vestir deixou de ser alegoria e ganhou conotação política. No paralelo, conheceu seu atual marido, o humorista Gregorio Duvivier, e engravidou. Com o nascimento de Marieta, há pouco mais de 1 ano, repensar o consumo fez ainda mais sentido – e ela deixou pra trás de vez a Giovanna que vinha sendo até então.

Passou a questionar tudo, do coador de café aos produtos de beleza. Das fraldas descartáveis às bexigas das festas infantis. A mudança foi radical. Hoje Giovanna é grande entusiasta da sustentabilidade e assumiu como missão passar isso para seus 65 mil seguidores no Instagram, onde dá dicas com a hashtag #comeceamudança.

Sua atuação lhe rendeu o convite para integrar, ao lado de Ana Paula Xongani e Marina Franco, o time de apresentadoras do programa de consumo consciente Se Essa Roupa Fosse Minha, uma coprodução GNT, Unilever e Conspiração, com direção de Isabel Nascimento Silva, que estreia no segundo semestre no GNT. E, assim, ela se consagra como uma jovem e importante voz da moda democrática, acessível e justa. A seguir, o papo que teve com Hysteria.

 

Conta um pouco do programa Se Essa Roupa Fosse Minha, que estreia em breve no GNT?

O Se Essa Roupa Fosse Minha é um programa de moda sustentável. Acho que o primeiro da televisão brasileira. Vamos falar aberta e profundamente sobre consumo consciente e o conceito de comprar menos mesmo. Somos eu, Marina e Xongani garimpando brechós, customizando peças e mostrando o universo da roupa de segunda mão. Tudo em São Paulo. Eu dou o olhar do estilo de vida sustentável.

Tem um quê de Marie Kondo?

Total. Mas nosso foco é menos organização e mais cuidar do consumo, de mudança de mindset. E,  apesar de eu amar a técnica, me incomoda ela falar para tirar as roupas do armário, de casa, mas não ensinar o que fazer com elas. Joga tudo na lata de lixo? O lixo não faz nada desaparecer.

Você sempre teve essa consciência?

Não! Eu hoje tenho uma calça jeans. Mas já fui uma super consumista de fast fashion, cheia de jeans H&M e Zara no armário. Ia pra fora do país e voltava com a mala abarrotada. Foi só quando morei em Barcelona, em 2010, que tive acesso pela primeira vez a brechós e roupas de segunda mão sem preconceito. Mas ainda demorou para eu me tornar consciente. Quando voltei ao Brasil trabalhei na extinta 284 (fast fashion nacional) e continuei comprando, comprando, comprando. Aí tive a ideia de criar o Projeto Gaveta, de troca de roupa, e mesmo achando o máximo trocar roupa, eu ainda comprava bastante Foi só em 2015 que comecei a mudar.

E como foi esse clique?

Primeiro comecei a perceber que as roupas de fast fashion não duravam, passei a estudar os materiais e a me questionar. E daí foi um caminho sem volta. Claro que por trabalhar com moda gosto de roupa, gosto de comprar. Mas desenvolvi uma consciência. Percebi também que não adianta consumir de segunda mão no mesmo ritmo desenfreado. Já me peguei num brechó com 15 roupas para provar sentindo a mesma euforia causada pela fast fashion. O ciclo é o mesmo: a sensação de ansiedade, a compra, o prazer efêmero e depois o vazio para começar tudo de novo.

E como você faz para escapar dessas armadilhas?

Criei mecanismos. Hoje, quando compro uma roupa, ela foi muito pensada. Antes de comprar pesquiso, vou à loja várias vezes, entendo o que falta no armário e apoio o pequeno produtor. É importante fazer um planejamento.

Mas rolam recaídas?

É importante humanizar: claro que tenho momentos de fraqueza. Outro dia estava exausta, com Marieta o dia inteiro, aí entrei numa farmácia e comprei um monte de coisa. Comprei por cansaço, por tristeza. Semana passada comprei um vestido por que paguei mais do que gostaria. Ele custou mais do que meu vestido de casamento, que comprei num brechó. Fiquei mal no dia seguinte, com ressaca moral. Mas é importante prestar atenção e perceber quais sentimentos te trazem essa vontade de consumir.

E o tal do armário-cápsula, você faz?

Eu usei especialmente quando mudei de São Paulo para o Rio. Essa mudança fez um caos no meu armário que era basicamente preto e minimalista. O Rio é mais colorido, cheio de tecidos leves. Além disso eu estava grávida, com outro corpo. Então tirei muita coisa do guarda-roupas, analisei o que tinha, separei as peças que usaria mais e fiz combinações infinitas. O resto eu dei. Sempre falo, dá de presente, doa, vende. Eu adoro dar de presente pros amigos coisas do meu armário. Tipo, ó, lembrei de você com essa peça, toma.

Tá, mas e quando vem a necessidade de comprar, que marcas você recomenda?

A C&A conseguiu fazer uma camiseta de R$ 20 biodegradável, que é só jogar na composteira. E a meta deles é até 2020 é trabalhar com um algodão mais sustentável. A linha de recém-nascidos, por exemplo, é toda de algodão orgânico. Para quem fala que moda sustentável não tem design, indico a Pink Blue, do Rio. Ela vai a bazares de igreja, pega os jeans que encontra e faz novas peças. E a Flavia Aranha, que é referência. Ela tem um preço mais salgado para grande parcela da população, mas quando se conhece o processo de fabricação a gente entende. Uma boa dica é ir na Roupateca e alugar peças dela.

Na época das semanas de moda você postou no seu Instagram que as grandes referências de moda estão na periferia e não nas longínquas passarelas. Em quem você se inspira?

Definitivamente não me inspiro no Paris Fashion Week. Me inspiro em quem não tem grana e  mesmo assim é estilosíssimo. E acho que grandes marcas perdem muito de não olhar com atenção para a periferia. No Rio, a Cidade de Deus, por exemplo, tem oito brechós. Oito! E não tem ninguém documentando esse estilo. E a galera tá aí, pagando pau pra quem tem dinheiro.

Este ano você começou um movimento no Instagram chamado de #comeceamudança, em que fala de sustentabilidade muito além da moda. Isso é novidade na sua vida?

O #comeceamudança nasceu no réveillon. Da busca do que eu poderia fazer para ajudar a conscientizar mais gente. O que posso fazer é comunicar. Então botei isso em prática e só comunico o que aplico no meu dia a dia. Falo das mudanças que estou vivendo. E eu estou amando escrever, divagar sobre o tema. Essa consciência chegou com a Marieta, é recente, passei a prestar atenção ao que compro no mercado, na embalagem de tudo. Foi com ela que comecei a questionar.

E qual é sua relação com a sustentabilidade no dia a dia que envolve filho, funcionários, família, enfim, rotina.

Aprendi a me respeitar e também a respeitar os outros. Estava ficando muito irritada no começo com lixo que ia errado pra reciclagem ou com lixos desnecessários. Até que um dia o Greg me chamou e falou: “Calma. Senão vira um martírio. Nada vem do dia pra noite.” Daí aprendi a relaxar, porque eu estava sofrendo. Esquecia meu copo reutilizável e me sentia fracassada por pegar um de plástico. Também não é por aí, né?

 

Isabel de Barros é jornalista, empreendedora, mãe e criadora da Nanu Box, um berço portátil e sustentável inspirado no modelo finlandês

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