Moda, história e orgulho negro em Nova York

A antropóloga e fashionista Mikaila Brown criou um tour de moda pelo Harlem que apresenta, além de lojas, um olhar apaixonante sobre a cultura do bairro

13.02.2019  |  Por: Luciana Paulino

image
Moda, história e orgulho negro em Nova York

Mikaila Brown no Harlem | Crédito: Fernanda Frazão

Quando o assunto é moda, Nova York tem muito a oferecer, das lojas do SoHo aos brechós moderninhos do Brooklyn. Mas a verdade é que dá pra ir muito além. Moda pode ser uma ferramenta potente de resistência política e resgatar narrativas perdidas no tempo. Pois foi com esse clima que Mikaila Brown percebeu que as ruas da comunidade negra do Harlem tinham muito o que agregar. Criou um tour especial e tem angariado fãs andarilhos interessados na vasta cultura de moda da comunidade negra nova-yorkina. O resultado é apaixonante.

Até se consolidar, a antropóloga enfrentou alguns obstáculos. O principal deles foi a ilusão de que o Harlem é um bairro perigoso – certamente por ser um bairro com uma população majoritariamente negra, não é mesmo? Aqui vale a colocação que, não por acaso, cidades como Salvador ou até mesmo a belíssima Jamaica são tidas como “locais perigosos” em muitas publicações turísticas. É o mesmo que acontece com o Harlem. Um fato que mostra o racismo estrutural arraigado que quebra ao meio durante o tour.

Mikaila Brown é uma dessas personalidades expansivas e carismáticas capazes de mudar rumos e ditar novas regras. É PhD em Antropologia e Educação pela Universidade de Columbia e tem uma combinação de talentos e paixões que a permitiram criar uma verdadeira expedição antropológica pela cena de moda do Harlem. O título “safári urbano” vem bem a calhar. “As pessoas se vestem de determinada maneira, pois elas querem comunicar algo. E estou aqui para contar as histórias por trás das peças roupa”, diz.

A ideia surgiu há quatro anos, quando usando seus conhecimentos de pesquisa Mikaila decidiu mergulhar na cultura de seu próprio bairro. A ideia era olhar para sua história, sociologia e política. Neste caminho ela descobriu muita coisa sobre a influência negra na moda, o que somado aos melhores lugares para fazer compras acabou virando uma experiência turística que une resgate histórico, consumo e entretenimento.

“O tour é mais do que uma consultoria de compras. O que faço é uma apresentação do meu bairro com o olhar da moda. As histórias que emergem dessas esquinas são muito empolgantes e, no geral, os turistas acabam comprando ao menos uma peça,  afinal, somos donos do estilo mais cool de toda Manhattan, mas a ideia vai muito além do consumo”, conta Mikaila, enquanto aponta um grupo de jovens pra lá de charmosos saindo da escola.

A expedição passa pela história do renascimento artístico do Harlem, na década de 1920, e, claro, pelo surgimento da cultura do hip hop, culminando nos dias de hoje com os movimentos da nova diáspora africana que se estabelece no bairro e dita tendências de moda e lifestyle.

Dentre as histórias narradas por Mikaila está, por exemplo, a do estilista Dapper Dan, que há quatro anos teve uma de suas icônicas peças plagiadas pela gigante de luxo Gucci. O desfecho da história teve Dapper Dan entrando para o time de criadores da Gucci e vestindo celebridades como Beyoncé, JayZ, Pharrell e toda a nata do hip hop americano atual.

O projeto de Mikaila nos faz lembrar o real significado da palavra negritude, que é a simples celebração da existência e da cultura negras. Mikaila transformou o que parecia ser um nicho específico em um meio poderoso de promover a sua comunidade. You rock, girl!

 

Luciana Paulino é relações-públicas paulistana. Atua como consultora de comunicação e está à frente da plataforma digital Black Bird, que propõe um olhar inclusivo para experiências de viagem

 

0 Comentários

Comentar

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *