O carnaval é uma fagulha de esperança

A folia como resistência quando o noticiário não dá folga e a sequência de tragédias desanima

20.02.2019  |  Por: Gaia Passarelli

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O carnaval é uma fagulha de esperança

Juliana Coelho | Piscina

Eu tô tentando animar pro carnaval. Juro que tô.

Salvei uns looks no Pinterest. Confirmei presença nos meus blocos preferidos via Facebook. Deixei comentários nas fotos de Instagram das amigas que tão aí curtindo o pré-carnaval que começou em janeiro. Mandei DMs falando SDDS CARNAVAL e é verdade, saudade mesmo, real-oficial. Até pedi minhas cabeças de volta pra amiga pra quem tinha emprestado.

Mas daí a abrir o gavetão de carnaval e botar na rua os maiôs, as purpurinas, o brilho, a alegria, o desprendimento… ainda não deu.

Por que não deu? Nem preciso listar. A distopia brasileira só vem aumentando de velocidade e entrou em modo acelerado em 2019. É uma derrota por dia. O noticiário não dá folga e a sequência de tragédias recentes são de desanimar qualquer uma.

Mas então vem uma amiga e me lembra: tem que insistir. “Puxa, logo você que ama tanto o carnaval, você que é nascida em fevereiro, que me ensinou a ir pra rua de manhã, puxar samba em balcão de boteco, segurar a corda no bloco sem estourar as mãos.” Mereço uma folga, ela disse. Mereço respirar acima da linha d’água. Mereço cerveja com confete, cantar com estranhos no metrô, sacudir a poeira e dar a volta por cima na travessia entre a República e o Municipal uma vez mais. Não sou só eu. Todas nós merecemos uma folga.

Férias. Não é ignorar a tragédia, não é fingir que tá tudo bem. É renovar a energia para poder seguir em frente. Quando a gente fala que carnaval é resistência não é só no sentido figurado de bater de frente com o autoritarismo reaça vigente. É também no sentido literal de valorizar o necessário para sobreviver frente a tanta má notícia.

O carnaval (infelizmente) não muda a situação de quem está vivendo na guerra do Rio de Janeiro, não vai derrubar a milícia que está no poder e nem vai trazer de volta a vida de quem morreu. Não há o que celebrar além de nossa própria capacidade de reconhecer a queda e não desanimar.

O carnaval de 2019 não é só de festa, é também de força. Por isso vou pra rua, sim. Vou pra rua pra encontrar uma fagulha de esperança. E é essa fagulha que vou usar pra botar fogo nas coisas.

 

Gaía Passarelli é jornalista e escritora, autora de Mas Você Vai Sozinha? (Globo Livros, 2016). Nascida e criada em São Paulo, mora num prédio velho da Bela Vista com o filho, três gatos e uma crescente coleção de guias de viagem. Você a encontra no twitter @gaiapassarelli e no site gaiapassarelli.com

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