O que vestem as mães?

A maternidade é uma condição perene e quase compulsória. Então por que ninguém faz 'roupa de mãe', durável, resistente, fácil de limpar e, se possível, com botões reforçados e bolsos e zíperes funcionais?

24.07.2018  |  Por: Nina Ribeiro

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O que vestem as mães?

Tornar-se mãe é um processo transformador e desgastante. Não só porque temos que lidar com mudanças internas, mas também porque nos deparamos com as (novas) expectativas dos outros sobre a nossa vida. Junto com o bebê nasce uma cartilha de como a mãe deve agir e isso, é claro, passa pela forma como nós nos vestimos e pelo que as pessoas entendem por “roupa de mãe”. Agora que deixamos de ser mulheres para, antes, sermos mães, nos dizem, de forma mais ou menos incisiva, que é hora de abrir mão das nossas roupas tão queridas.

Se você buscar pela expressão “roupa de mãe” no Google Imagens, vai ter a melhor tradução do que estou dizendo em roupas. Ali, scroll após scroll, vemos mães e filhas juntas, usando a mesma peça. Seria fofo se não fosse deprimente. E tenha certeza, não são as menininhas que estão ousadas demais, são as mães que estão infantilizadas, com peças conservadoras e encaixadas no pior conceito de “extremamente femininas”. Nas séries e novelas, vemos a repetição desse modelo – a não ser em personagens “quebradoras de padrões”. Veja: para compor uma personagem “mãe normal” recorre-se ao estereótipo de roupas sem informação de moda contemporânea, sem ousadia e sem personalidade.

E isso se estende a muitos de nós. Feche os olhos e pense em “roupa de mãe”. Na maioria dos casos vêm em mente roupas que escondem o corpo, disfarçam defeitos e representam mais as nossas próprias mães e avós do que nós mesmas – mesmo que sejamos mães.

Não é de se estranhar que hoje, empoderadas e feministas, sintamos que o conceito de “roupa de mãe” não deva existir. Mas ele deve, sim. Só não é da forma como vem sendo colocado hoje.

Roupas que não me representam

Eu estava preparada para vários aspectos da maternidade. Para a solidão, para a responsabilidade, para a privação de sono e até para os palpites indesejados. Mas não preparei meu armário e, sinceramente, não pensei que precisaria.

Minha ideia era ir contra a corrente mesmo e logo voltar à minha coleção de camisetas e meus tão amados vestidos curtos. Mas no meio do caminho tinha a amamentação e muitas das minhas roupas não eram adequadas para a prática. Não exitei em buscar peças no meu estilo que facilitassem a amamentação. Não achei praticamente nada. E segui aquele ciclo do final da gravidez em que usamos as mesmas três ou quatro roupas em looping. Resignada, achei que isso seria temporário, só enquanto amamentava.

Novamente, nada disso. Quando o bebê cresceu, foram aparecendo outras necessidades em relação à roupa. Afinal, passo parte do dia correndo atrás da cria, sentando no chão pra brincar, me sujando de comida e afins. Neste momento me perguntei, por exemplo: quem faz roupas com bolsos onde não cabe um smartphone? Por que tão poucas marcas investem em short-saias? Pra que usar tecido rígido em modelos em que não podemos nos mover com agilidade?

Mulheres que se tornam mães não deixam de ser mulheres e, por isso, devem se sentir confortáveis em usar a moda como recurso identitário. O papel materno não deveria ser ignorado pelas marcas de moda feminina na hora da criação das peças.

Ainda queremos nos vestir de forma sensual/ousada/criativa/chic/moderna/vanguarda. Ser mãe não precisa influenciar diretamente o estilo daquilo que vestimos. As roupas, de diversos estilos, é que deveriam se adaptar ao nosso novo status de mãe.

Mas o que deveria ser roupa de mãe, então? Primeiramente, deveria ser durável, fácil de limpar e resistente. Não seria mal que tivessem bolsos e zíperes funcionais, botões reforçados e, quem sabe, fácil e discreto acesso para amamentação. Poderia ser uma roupa que vestisse confortavelmente o corpo pós-parto e fosse se ajustando às nossas novas formas.

Aliás, roupas que levam em conta situações “especiais” da vida da mulher já existem. Há as conhecidas roupas de gestante e também bacanérrimas peças criadas para mulheres que andam de bicicleta. Mas ser mãe é uma condição perene e quase compulsória, e merecia mais do que uma marca dedicada ou meia dúzia de peças especiais tagueadas. Roupa de mãe deveria ser um conceito amplo e dissolvido no que se define como roupa de mulher. Porque cada vez que pensamos em uma tag com este nome, muito provavelmente teremos apenas um estilo imposto para uma gama infinita de mães.  

 

Nina Ribeiro é mãe e escreve sobre feminismo e moda na internet. Tem um projeto no Instagram com textos sobre amores que acabam 

 

1 Comentários

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Uma resposta para “O que vestem as mães?”

  1. Carol Frexeira disse:

    Minha irmã teve filho recentemente e como tenho uma marca de roupas femininas fiz várias peças para ela. Muito estudo pra obter roupas com estilo…mas consegui bons resultados. O melhor foi um vestido/blusa que abotoa nos ombros, ótimo pra amamentar e sem botões no rosto no bebê.

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