Sexo lésbico seguro, esse grande desconhecido

Os riscos existem, mas faltam informação, atendimento médico adequado e métodos de prevenção eficientes

28.06.2019  |  Por: Luiza Rabello

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Sexo lésbico seguro, esse grande desconhecido

Marcela Cantuária | Piscina

Seis anos atrás concluí meu TCC sobre atenção ginecológica oferecida às lésbicas. Para escrever este artigo fiz uma pesquisa imaginando que encontraria algumas novidades sobre prevenção de DST/IST nesta área. Lamento dizer que o que aconteceu foi uma viagem ao passado. As discussões em relação ao tema ainda giram em torno da falta: falta de informação; falta de atendimento médico adequado; falta de métodos de prevenção que sejam bons o suficiente para possibilitar a adesão; e falta de métodos com preço acessível.

Falta muita coisa, mas sobra opinião sem embasamento. Como lésbica, acho revoltante ler alguns trabalhos escritos por pessoas heterossexuais que taxam as lésbicas de “ignorantes” por acharem que não podem pegar DSTs e “preguiçosas” por não usarem métodos preventivos. No meio de todo um blablablá acadêmico parece que é esse o discurso de fundo. E reparem, ele é centrado em uma ideia medicalizante tradicional que acredita que se a paciente não adere a um determinado tratamento ou prática de prevenção, a paciente está errada e ponto final.

É muito louco que a falta de informação entre lésbicas (e outras mulheres que fazem sexo com mulheres) surpreenda as pesquisadoras, porque na verdade nem os profissionais de saúde têm essa informação. Existem pesquisas no México, no Brasil e Estados Unidos, todas com relatos muito parecidos de lésbicas que dizem que ginecologistas não querem fazer pedidos de exames depois de informados sobre suas sexualidades – o que já aconteceu inclusive comigo. No caso de pacientes bissexuais, os exames costumam a ser pedidos pelo histórico de relações sexuais com homens. Isso sem contar os casos explícitos de violência contra lésbicas e bissexuais em consultórios ginecológicos.

Pois além de pesquisas falta também boa vontade para discutir o tema.

Em relações sexuais entre mulheres (e de pessoas que não se identificam como mulheres, mas que possuem vagina) é possível transmitir ou ser contagiada com: vaginose bacteriana, herpes, candidíase, tricomoníase, HPV e gonorreia. Existe também a possibilidade de contágio de HIV e hepatites B e C. Nestes últimos casos a probabilidade de contágio é pequena, mas pode aumentar no caso da presença de feridas e/ou sangue menstrual. Ou seja, existem riscos.

E agora vamos falar sinceramente dos métodos de prevenção de transmissão de DST/IST no sexo lésbico? É muito nítida a falta de investimento na criação de métodos próprios para o sexo entre mulheres. O que nos leva a muita improvisação, como é o caso da camisinha masculina cortada para criar uma barreira para o sexo oral e outras práticas, como o tribadismo (também conhecido xana-com-xana ou colar-velcro). Essa barreira também pode ser criada com o dental dam, que foi originalmente criado para cirurgias ortodônticas. Hoje ele já está a venda em alguns sex shops especificamente como método de barreira, alguns inclusive com aroma, o problema é que o dental dam é caro e difícil de encontrar.

É preciso falar, diagnosticar, tratar e, claro, prevenir

Minha experiência com a camisinha cortada é a seguinte: para o sexo oral o gosto e a sensação na boca são estranhas, é difícil manter no lugar e assim realmente isolar toda a mucosa genital, e mais:  você tem que segurar com ambas mãos, o que limita muito as possibilidades. E no caso do tribadismo? É impossível mantê-lo no lugar e então o propósito da proteção se perde totalmente.

Uma ótima opção seria a calcinha de látex, que por enquanto é cara (25 dólares um pacote com quatro) e, vejam só, geralmente marquetada para mulheres heterossexuais com vergonha de seus cheiros e fluidos durante o sexo oral. Em algumas cartilhas e sites online é recomendado o uso de filme plástico (PVC), mas outras fontes não aprovam esse material por sua porosidade. A camisinha feminina só serve como método de barreira no sexo entre vagina e pênis.

Além disso, luvas cirúrgicas podem ser usadas para os dedos e no caso do uso de brinquedos sexuais se recomenda o uso da camisinha masculina, que deve ser trocada antes de o brinquedo ser usado em outra pessoa ou na mudança entre sexo anal e vaginal.

Para mulheres que possuem pênis, no caso de penetração a camisinha é a melhor opção.

Com todo esse panorama é compreensível que a adesão a métodos de prevenção no sexo lésbico seja muito pequena, por isso é importante muita sinceridade ao tratar do assunto e também apostar na prevenção e no tratamento por meio de uma atenção ginecológica de qualidade. 

Ou seja, é o contrário do que muitos médicos costumam fazer. É preciso falar, diagnosticar, tratar e, claro, prevenir. Portanto, insista com seu ginecologista para que todos os exames sejam feitos e não tenha medo de procurar outro profissional caso sinta resistência da parte dele. 

Também é importante lembrar que nenhuma relação sexual é totalmente isenta de riscos, mesmo com o uso de proteção. E, claro:  que nenhum sexo é seguro sem consentimento.

Para mais informações sobre prevenção no sexo lésbico, consulte esta linda cartilha do grupo Laços e Acasos.

 

Luiza Rabello é escritora e tradutora freelancer, mestra em Estudos da Mulher pela UAM (Cidade do México)

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