Tecnologia a serviço da diversidade
De menina excluída a palestrante no G-20: conheça a história de Buh D'Angelo, criadora da primeira empresa de informática comandada por mulheres negras
16.10.2017 | Por: Mayara Efe
Quantas mulheres trabalhando com tecnologia você conhece? E negras? É justamente por estar inserida em um dos mercados com maior taxa de desigualdade racial e de gênero do mundo que Buh D’Angelo criou o InfoPreta, a primeira agência digital que incentiva, treina e contrata mulheres negras para trabalhar com informática.
Essa história começa em 2012, quando Buh conseguiu o primeiro estágio na área de tecnologia. Ela tinha 16 anos. Mas, diferente do que imaginava, não ocupou uma estação de trabalho. Foi obrigada a limpar banheiros meses a fio. Em vez de desistir, Buh resolveu enfrentar e decidiu que mudaria esse cenário. Assim, em 2013 nasceu o InfoPreta, que hoje trabalha também com integrantes de outras minorias. “São nordestinos, negros, LGBTs e pessoas com problemas psicológicos como dislexia e déficit de atenção, que a sociedade insiste em deixar de fora do mercado de trabalho,” ela explica. O que Buh faz é dar espaço, treinamento e um salário digno para essas pessoas. Hoje, além de consertar computadores de forma remota ou presencial, a empresa cria plataformas e aplicativos e oferece palestras, cursos e oficinas.
A programadora transformou uma história de exclusão e racismo não só numa empresa, mas numa forma bacana de inclusão. “Eu sou Buh, sou maravilhosa, mas depende do dia”, brinca a empreendedora, durante a nossa conversa na sede da empresa, enquanto corta o cabelo. Essa é a mesma Buh que em 2017 representou o Brasil no G-20, onde fez uma apresentação para os maiores líderes do mundo.
Ela foi escalada graças ao projeto Notes Solidários da Preta, iniciativa que recolhe notebooks quebrados como doação, conserta e os distribui (sem custo) para estudantes. Fundamental: os computadores são personalizados para as necessidades acadêmicas de cada aluno. “Doamos preferencialmente para negros, negras e mamães. O êxodo dessas pessoas nas universidades é muito grande pelo racismo e as condições de permanência.” A mesma iniciativa rendeu a Buh o prêmio Skills for Girls, em Berlim.
Foi ainda na infância que Buh descobriu a paixão pela leitura. “Eu lia enciclopédias alucinadamente, minha mãe é bibliotecária, então eu ficava no trabalho dela lendo sem parar.” Se por um lado tinha a mãe para lhe apresentar os livros, por outro, tinha o pai incentivando seu interesse por números, ciências exatas e sobretudo por desmontar equipamentos. A primeira coisa que desmontou foi um carrinho com o qual brincava: “Eu queria descobrir como ele andava.”
Seu encanto por tecnologia começou aí. “Primeiro fui para a eletrônica, depois para automação industrial, manutenção de computadores, robótica e agora uso um pouco de tudo isso aqui na agência”, diz com naturalidade. Mas apesar da vasta formação, Buh ainda não se formou na faculdade. “O racismo me pegou, e era escrachado. Quando tinha atividade em grupo, sempre me deixavam de fora. As pessoas mal falavam comigo”, lembra. “Sou da indústria, cresci no meio de pedreiros, não tenho muita paciência para esse tipo de coisa. Larguei o curso há um ano e meio.” Claro que os pais não ficaram felizes. Queriam que a filha se formasse – e por insistência deles Buh acaba de começar um curso à distância de gestão financeira (EAD). “O bom é que à distância não preciso olhar para a cara de ninguém”, diz, rindo.
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